Cortar agora pode reduzir risco sistêmico sem desancorar preços: inflação tende a arrefecer, emprego dá sinais de ajuste e a comunicação do Fed precisa ser clara para preservar confiança e estabilidade.
A decisão de reduzir a taxa de juros nos Estados Unidos não é apenas uma questão técnica: ela impacta diretamente a vida das pessoas, o ritmo da economia e, principalmente, as expectativas sobre o futuro. Quanto mais transparente e bem comunicada for essa decisão, maior será a estabilidade dos indicadores econômicos e a confiança do mercado.
Os bancos centrais, como o Fed, são formados por equipes altamente capacitadas e têm acesso a uma gama imensa de informações sobre a economia. Por isso, o mercado espera que suas decisões sejam embasadas não só em modelos matemáticos, mas também em uma leitura cuidadosa do comportamento econômico. Uma comunicação clara é fundamental: quando o banco central se expressa com precisão, transmite controle e segurança. Por outro lado, mensagens ambíguas geram especulação, aumentam a incerteza e podem provocar volatilidade desnecessária. Infelizmente, o Fed tem falhado nesse aspecto nos últimos anos, minando a credibilidade de suas decisões.
O momento atual ilustra bem esse desafio. Muitos analistas questionam se o Fed está certo em considerar a redução dos juros, já que a inflação parece estar subindo. Essa dúvida revela a necessidade de um discurso claro e bem embasado, sem espaço para interpretações. O cenário de estagflação é pouco provável e continua apenas na cabeça de uma parte dos analistas. Apesar das críticas, acredito que o cenário mais provável é o de queda da inflação acompanhada de um pequeno aumento do desemprego – um ciclo econômico normal, não um desastre.
A economia americana mostra sinais de desaceleração, mas nada fora do esperado. O preço do petróleo caiu e está abaixo de 60 dólares o barril, e as tarifas tiveram impacto menor do que se previa sobre a inflação. É importante lembrar que choques econômicos tendem a se dissipar com o tempo, suavizando seus efeitos nos preços. A mudança hoje é que o comportamento inflacionário atual é semelhante ao do fim de 2024, quando o Fed hesitou em cortar juros.
Outro fator decisivo é o emprego. Pequenas variações na taxa de desemprego não preocupam, mas ajustes mais intensos podem ser perigosos. A criação de emprego no setor público se destacou nos últimos anos nos EUA e isso está sendo ajustado, sendo visto o primeiro impacto no mercado. O mais preocupante é o resultado que a inteligência artificial tem produzido, reduzindo consideravelmente a quantidade de vagas nas grandes empresas de tecnologia. Se o desemprego acelerar, o consumo cai, as empresas vendem menos e a receita diminui. Como o mercado americano é altamente alavancado e a maior parte das dívidas é securitizada, o risco se espalha por todo o sistema.
Nesse contexto, o Fed pode – e deve – reduzir os juros para evitar um risco de colapso generalizado, especialmente porque a inflação não está fora de controle. Se o foco for apenas na alta pontual de 0,2% no índice de inflação, o efeito da manutenção de juros num patamar elevado pode ter um impacto relevante nos bancos regionais e congelar o mercado de curto prazo, levando a um cenário de colapso, queda da inflação e disparada do desemprego.
Por fim, vale lembrar: a inflação é um fenômeno monetário. O grande volume de dinheiro impresso só impactou os preços porque as pessoas receberam cheques diretamente. Se isso não se repetir, a velocidade de circulação da moeda será baixa e a liquidez ficará concentrada no mercado financeiro. Por todos esses motivos, o Fed tem espaço – e razões sólidas – para baixar os juros agora.









