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segunda-feira, dezembro 29, 2025
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A nova postura da África e seus potenciais impactos para o Brasil

A mudança de postura econômica dos países africanos tende a produzir efeitos relevantes também para o Brasil. O avanço consistente da participação chinesa e dos países árabes no continente alterou profundamente a dinâmica de financiamento, investimento e crescimento africanos, gerando impactos diretos sobre a Europa e, de forma menos evidente, sobre economias concorrentes por capital e atenção internacional, como a brasileira.

A presença chinesa e árabe caracteriza-se por menor burocracia, maior rapidez na alocação de capital e um modelo baseado em acordos de negócios concretos, concessões e autorizações operacionais, em contraste com o modelo europeu, frequentemente marcado por extensas condicionalidades e processos decisórios lentos. Essa mudança na velocidade e previsibilidade do capital redefiniu o equilíbrio de forças, fortalecendo a posição africana e reduzindo a capacidade de barganha tradicional da Europa.

Para compreender a dimensão dessa transformação, é necessário observar alguns movimentos emblemáticos. A construção da maior refinaria de petróleo em linha única do mundo, em Lagos, financiada e executada majoritariamente com capital e mão de obra africanos, teve como objetivo central reduzir a dependência energética da Nigéria e demonstrar a capacidade do continente de executar projetos de infraestrutura de grande escala. O mesmo grupo empresarial, a Dangote Group, celebrou posteriormente um acordo com o governo do Zimbábue para a construção de um oleoduto de aproximadamente 2.000 quilômetros, reforçando a percepção de que resolver os gargalos históricos de infraestrutura e logística pode representar o verdadeiro “prêmio” do crescimento africano. Esse processo está em curso de forma acelerada.

Esse novo posicionamento ficou particularmente evidente na cimeira África—União Europeia realizada em novembro de 2025, em Angola. Diferentemente de encontros anteriores, os países africanos não se limitaram a gestos diplomáticos, mas apresentaram propostas objetivas de investimento acompanhadas de condições claras, conscientes de que o capital europeu já não é a única opção disponível. O Corredor do Lobito, projeto de infraestrutura que conecta o porto angolano à República Democrática do Congo e à Zâmbia, ilustra essa mudança de paradigma: não se está a falar apenas de escoamento de recursos naturais, mas de transferência de conhecimento, maior participação da força de trabalho local e integração empresarial africana.

A África passou a negociar os termos dos acordos, e não apenas a ratificá-los. O continente reúne uma combinação rara de crescimento populacional, mão de obra abundante e uma demanda estrutural por infraestrutura, especialmente nas regiões afastadas do litoral. Esse conjunto de fatores vem atraindo a atenção global. Nairóbi consolidou-se como um polo de startups de tecnologia; Ruanda executa um ambicioso projeto de transformação institucional e econômica; e o Zimbábue pode ver sua infraestrutura profundamente remodelada ao longo da próxima década. A Europa, por sua vez, começa a sentir o custo econômico e estratégico desse avanço africano.

Nesse contexto, o Brasil disputa capital e relevância com a África, mas permanece excessivamente concentrado em debates superficiais, com limitada capacidade de gerar projetos estruturantes de longo prazo. Fala-se pouco em desenvolvimento concreto e aceita-se, com naturalidade, um ritmo de avanços incompatível com a dimensão do país. Os principais atores políticos e econômicos parecem mais inclinados a discorrer sobre problemas conhecidos do que a implementar soluções efetivas.

O cenário global caminha rapidamente para uma maior dependência de metais críticos e mão de obra. Embora a qualificação média africana ainda seja baixa, trata-se de uma variável passível de rápida melhoria, dada a juventude da população. O Brasil, por outro lado, enfrenta desafios persistentes de qualificação e um perfil demográfico progressivamente mais envelhecido. O custo dessa combinação pode se materializar de forma abrupta e inesperada nos próximos anos.

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