Entre a tentação do dinheiro rápido e o arrependimento parcelado, um aniversário que vem com bolo, boletos e saldo reduzido no FGTS
por Geoffrey Scarmelote
Amanhã é meu aniversário e, junto com os parabéns e os boletos, chega também o famoso saque-aniversário. Sim, confesso: recorro a ele com certa frequência, mesmo sabendo dos riscos. É aquele tipo de relação meio tóxica com o dinheiro: a gente sabe que faz mal, mas volta porque dá um alívio temporário. E lá vou eu, mais uma vez, liberar parte do FGTS como quem pede um empréstimo pra si mesmo.
O saque-aniversário foi criado lá em 2019, pela Lei 13.932, com a promessa de dar mais autonomia ao trabalhador. Na prática, virou uma válvula de escape. Muita gente, eu incluso, achou que era a chance perfeita de “adiantar o futuro” em prestações anuais. Hoje, são mais de 35 milhões de brasileiros que fazem o mesmo ritual: sacar um pedacinho do que, teoricamente, deveria ser reserva pra emergências mais sérias.
No meu caso, nem espero o aniversário chegar direito. Já parto pra antecipação via empréstimo, dissolvo o fundo em parcelas e deixo o saldo encolher como sorvete no sol. É rápido, fácil e, claro, perigoso. Porque o prazer é instantâneo, mas o arrependimento é parcelado. Depois de tantas retiradas, começo a me perguntar quantas reservas terei quando a vida resolver me cobrar juros de verdade.
O lado amargo vem quando lembro que esse dinheiro é o mesmo que um dia poderia me ajudar a financiar meu próprio imóvel. Aí a ficha cai: cada antecipação de hoje é um pedacinho de entrada que deixo de ter amanhã. E não adianta reclamar do sistema. Fui eu quem clicou em “aceitar condições” sem ler as letras miúdas.
Mesmo assim, há algo quase simbólico nesse hábito: no dia do meu aniversário, o presente sou eu quem me dá… só que pago com meu próprio futuro. É o retrato de uma geração que aprendeu a sobreviver com criatividade financeira e, às vezes, com um toque de desespero.
Então, sim: feliz saque-aniversário pra mim. Que o bolo venha simples, o saldo não venha zerado e que, um dia, eu consiga comemorar não o saque, mas o acúmulo. Porque, convenhamos, viver de antecipação é o jeito mais moderno — e mais perigoso — de soprar velinhas.