Com Selic elevada e aversão ao risco, companhias preferem esperar cenário mais favorável para abertura de capital.
O mercado de capitais brasileiro atravessa um período prolongado de estagnação no segmento de ofertas públicas iniciais de ações (IPOs). Desde o início de 2024, apenas duas companhias conseguiram listar suas ações na B3, segundo dados compilados pela Bloomberg. O número é muito inferior à média registrada em ciclos anteriores, quando o Brasil chegou a superar 20 aberturas por ano.
Especialistas apontam que a principal trava é a combinação de juros elevados e ambiente de incerteza global. De acordo com análise publicada pelo Valor Econômico, empresas que tinham planos de estrear na bolsa — de setores como varejo, tecnologia e saúde — preferiram engavetar os projetos, temendo baixa demanda de investidores institucionais e preços muito abaixo do esperado.
Outro fator que pesa é a competição com a renda fixa. Com a Selic ainda em patamares de dois dígitos, papéis de crédito privado e títulos públicos oferecem retornos atrativos com risco reduzido, desviando parte relevante do capital que poderia ser destinado à bolsa. “Enquanto o juro real for tão elevado, o investidor local não terá apetite para ativos de maior risco”, explicou um gestor ouvido pela Reuters.
Mesmo companhias com histórico sólido enfrentam dificuldades. Um estudo da XP Investimentos mostra que o desconto médio exigido por investidores para entrar em novas ofertas supera 25% em relação às avaliações privadas recentes das empresas. Isso tem levado executivos a optar por levantar capital por meio de rodadas privadas ou emissões de dívida, em vez de abrir o capital.
Ainda assim, analistas não descartam uma reativação do mercado no médio prazo. “Se a curva de juros futuros confirmar trajetória de queda a partir de 2026 e o cenário político se estabilizar, podemos ver uma janela mais favorável”, disse um relatório do Itaú BBA. A expectativa é que companhias de energia renovável, infraestrutura e agronegócio sejam as primeiras candidatas a retomar os processos.
Enquanto isso, a B3 se concentra em diversificar receitas com o aumento das operações de derivativos e renda fixa. A bolsa, que também sente a queda no número de novos investidores pessoas físicas, busca manter relevância enquanto aguarda a próxima onda de aberturas de capital.